Experiência Precoce

04-07-2010 14:00

 Observações e teorias sobre a Experiência Precoce

Até aqui temos vindo a fazer referência à parte “prática” da experiência precoce. Agora iremos reforçar essa parte prática através de teorias e algumas observações, tais como o estudo de Berkeley sobre o crescimento e desenvolvimento humano e a hipótese de Benjamim Bloom sobre o crescimento intelectual.

Relativamente ao 1º estudo (estudo de Berkeley sobre o crescimento), podemos dizer que teve origem na Universidade da Califórnia (em Berkeley), no início de 1929 e a sua principal autora foi Nancy Bayley, uma pioneira no campo do desenvolvimento humano, que dedicou a sua vida a medir o desenvolvimento intelectual e motor em seres humanos (Psychology  Encyclopedia, 2009).

Segundo Sprinthall e Sprinthall (1990), o estudo de Berkeley consistiu numa avaliação de um grupo de sujeitos ao longo de várias décadas (experiência longitudinal), que tinha como finalidade compreender os processos de desenvolvimento humano.

Entre as variadas descobertas de Bayley acerca do desenvolvimento humano, iremos destacar apenas algumas de grande importância. Em primeiro lugar, Bayley descobriu que ao longo do tempo (anos) existe uma alteração do quociente de inteligência do indivíduo, uma vez que este está constantemente sujeito a novas estímulos por parte do meio que o rodeia. Esta constatação permitiu afirmar que os QIS não são constantes. Porém, estes resultados vieram contrariar alguns psicólogos que defendiam a imutabilidade do QI(Sprinthall & Sprinthall, 1990).

Em segundo lugar, Bayley verificou através de relações entre a medição dos QIs em diferentes idades, que a variabilidade do QI é maior durante os primeiros anos de vida (o que pode dever-se à variedade de estímulos que a criança consegue captar), concluindo que o QI era simétrico em relação à idade da criança (Sprinthall & Sprinthall, 1990).

Os resultados de Bayley permitiram também concluir que a nossa capacidade intelectual pode evoluir até aos 50 anos de idade, o que significa que ao contrário do que muitos autores defendem, a capacidade intelectual pode continuar a aumentar ao longo da vida. Contudo este aumento está muito relacionado com a interacção do sujeito com o meio, por exemplo, uma pessoa que ao fim do 9º ano de escolaridade deixa de estudar para ir trabalhar para uma loja de roupas, está menos sujeito ao crescimento intelectual do que uma pessoa que continue a estudar (Sprinthall & Sprinthall, 1990).

Bayley conclui também que as componentes da inteligência alteram-se consoante o nível etário, defendendo, tal como Jean Piaget, que o desenvolvimento intelectual na infância está dividido por estádios.

Por fim, Bayley descobriu que não houve diferenças relacionadas com o género no desenvolvimento físico e mental (Psychology Encyclopedia).

Estando directamente relacionado com a segunda destas conclusões de Nancy Bayley, surge a Hipótese de Benjamim Bloom, um estudioso e investigador no campo da Educação, que definiu o desenvolvimento intelectual através de uma curva de crescimento com aceleração negativa, cuja leitura transcreve a diminuição do efeito positivo do ambiente em relação à criança, consoante o aumento da idade (Sprinthall & Sprinthall, 1990).

Assim, Bloom concluiu que quanto mais nova for a criança, mais irá beneficiar de experiências enriquecedoras (Sprinthall & Sprinthall, 1990).

De acordo com Sprinthall e Sprinthall (1990) aos 6 anos de idade (idade em que entramos para a escola) temos mais de metade da nossa capacidade cognitiva formada (2/3) e consequentemente o potencial da criança para um desenvolvimento intelectual começa a abrandar, daí que seja importante uma intervenção mais precoce (como por exemplo a pré-escola), especialmente para grupos mais desfavorecidos. É por esta razão que Bloom defende a importância da experiência precoce benéfica no desenvolvimento cognitivo.

Tal como aprendemos na disciplina de Psicologia do Desenvolvimento I, para que a criança tenha um bom desenvolvimento é fundamental que esta esteja frequentemente sujeita a estímulos e a uma boa vinculação. Quando nos referimos a uma boa vinculação pretendemos salientar a ligação entre a qualidade da vinculação durante a infância e as áreas do desenvolvimento social, cognitivo e emocional.

Relativamente à experiência precoce, J.McV. Hunt concluiu que a privação precoce de estímulos é muito mais prejudicial para o desenvolvimento motor da criança, do que a própria restrição motora precoce uma vez que pode trazer consequências futuras quer a nível motor, quer a nível de desenvolvimento intelectual (Sprinthall & Sprinthall, 1990). Para apoiar estas afirmações, Hunt serviu-se do seguinte exemplo:

“As crianças Hopi que são criadas dentro de umas faixas ou bolsas onde permanecem durante todo o dia, faixas estas que inibem quase totalmente os seus movimentos, começam a andar tão cedo quanto as crianças Hopi que podem usar plenamente as suas pernas” (Sprinthall & Sprinthall,1990, pág. 77).

Como exemplo, podemos servir-nos do filme do “Menino Selvagem” de François Truffaut, baseado num caso verídico, que relata a história de uma criança de onze ou doze anos que foi capturada num bosque, tendo vivido afastado da sua espécie e ficando depois à guarda do Dr. Jean Itard. Quando foi capturado, o menino andava como um quadrúpede, tinha hábitos anti-sociais, não falava, não se interessava por nada e a sua face não mostrava qualquer tipo de sensibilidade. Assim, o seu isolamento passado condicionou a sua aprendizagem futura que, deveria ter sido realizada durante a sua infância (época em que o seu cérebro apresentaria mais plasticidade, existindo uma facilidade de aprendizagem, socialização e interiorização dos comportamentos característicos da sua cultura) (Gonçalves, Jorge e Peixoto, Maria A., 2000)

            Para provar que a inibição de estímulos prejudica o desenvolvimento das crianças temos também o caso de Wayne Dennis que descobriu um orfanato em que as crianças eram mantidas num isolamento extremo. Em consequência disso quase todas as crianças apresentavam um atraso mental bastante elevado. Esta observação permite-nos mais uma vez concluir que a hereditariedade e o meio influenciam de igual modo o desenvolvimento da criança.

            Ao comparar estas crianças com as crianças Hopi, verificamos uma grande diferença. Mas qual a razão destas diferenças, se ambas foram inibidas de estímulos? Tal como Hunt afirma “as crianças Hopi criadas dentro das faixas eram muitas vezes levadas às costas das mães. Assim, apesar dos seus braços e pernas estarem restringidos, os seus olhos e ouvidos podiam deliciar-se com uma rica variedade de estímulos” (Sprinthall & Sprinthall, 1990, pág.78).

Deste modo, Hunt conclui que a variedade de estímulos é o factor fundamental para o desenvolvimento intelectual, alertando-nos para o “problema do ajustamento”, em que devemos ter em conta o crescimento presente da criança, sendo apenas necessário apresentar estímulos adequados à sua idade, caso contrário (excesso de estímulos) a criança pode ficar frustrada, podendo rejeitar a interacção com o ambiente.

 

https://www.scribd.com/doc/29127253/A-importancia-da-Experiencia-Precoce

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